Nesse especial para o Super Bowl LV, você já conferiu a história da Sarah Thomas, a primeira árbitra da NFL. No entanto, ela não será a única presença feminina no evento. Na sideline, a comissão técnica do Tampa Bay Buccaneers terá duas mulheres entre seus membros: Maral Javadifar, treinadora assistente de força e condicionamento físico, e Lori Locust, treinadora assistente de linha defensiva.
A propósito, o Bucs é o primeiro time da NFL a possuir duas mulheres como treinadoras. Pode parecer pouco, mas toda mulher com um cargo na NFL representa resistência. É graças a pessoas fortes como elas que meninas podem sonhar com um futuro diferente. Mas não é fácil, ninguém nunca disse que seria. Então venha conhecer um pouco sobre as duas guerreiras que venceram a NFC.
Maral Javadifar
Essa é a história de uma grande mulher, que teve como inspiração de força e coragem sua mãe, fugitiva do Irã quando o governo começou a reprimir e retirar os direitos das mulheres. Maral, tal qual sua mãe, é uma mulher que não desiste de lutar nunca.
Maral nasceu e cresceu em Queens, New York, onde estudou na Pace University – universidade onde fez parte do time de basquete feminino. Foi recrutada após uma lesão de ACL, que poderia ter dado fim a sua carreira esportiva, porém isso não a abalou. Como jogadora de Pace, conseguiu ir a NCAA três vezes em quatro anos.
Mas não foi somente isso: Maral ainda foi brilhante em sala de aula. Formou-se bacharel em ciências, especialidade biologia molecular. Por conta da lesão sofrida antes da universidade, desenvolveu paixão por medicina esportiva. Utilizou seus momentos de dor como alavanca para mais uma conquista: doutorado em fisioterapia pela New York Medical College.
Na primavera de 2019, ela foi contratada pelo Buccaneers para fazer parte da comissão técnica do time como assistente de condicionamento físico. Todo o trabalho duro foi imediatamente compensado. Seu conhecimento, experiência e até mesmo a vida pessoal fizeram com que ela tivesse essa oportunidade na NFL.
Quando estava na universidade, sua maior paixão era a biologia, sua vontade era trabalhar com fisioterapia, mantendo o sonho de fazer parte do esporte. Maral conseguiu unir todos os quesitos e, graças a todas as experiências jogando basquete, percebeu como precisava ser forte para correr atrás de seus sonhos.
Existem milhares de mulheres completamente capazes de assumirem cargos de treinadoras, ou o que quer que seja dentro da liga e Maral acredita que elas só precisam de uma oportunidade de mostrar seus valores. “O conselho que eu dou a todas as crianças, não só as meninas, é correr riscos e trabalhar duro. O sacrifício vale a pena.”
“Eu tenho orgulho de fazer parte desse importante movimento que está acontecendo nos esportes. É algo que já deveria ter acontecido há muito tempo, mas estou emocionada de ter essa oportunidade de mudar o padrão ao lado de tantas outras treinadoras talentosas”. Maral Javadifar.
O que eu tenho a dizer sobre ela? Javadifar representa um exemplo a ser seguido, uma inspiração. Ela integra duas áreas importantes na minha vida: o esporte e STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática). São dois meios machistas e com pouca representatividade feminina. Entretanto, isso não a abalou e tenho certeza de que não vai desistir de crescer em ambas as profissões e, graças a ela, eu também não irei. Aqui fica meu muito obrigada, Maral, por tanto, mesmo que você nem saiba.
Lori Locust
Enquanto a história de Javadifar mostra várias conquistas pessoais, seja com o esporte ou academicamente, no caso de Lori o foco é o quanto ela teve que sacrificar para estar onde está hoje. Mas não é só isso, com ela também é possível aprender como a diferença de gênero está enraizada na sociedade e como as oportunidades são diferentes.
Lori é mãe de dois filhos e trabalhou para a indústria do seguro por 20 anos. Sempre amou o futebol americano, foi então que aos 40 anos teve chance de jogar. No entanto, ela sofreu uma grave lesão no joelho que a distanciou dos gramados. Mesmo assim, decidiu que não queria ficar longe do esporte, então se esforçaria para ser uma treinadora.
Começou treinando times de high school sem receber um centavo, afinal escolas não tinham recursos para pagá-la. Para ela isso não era um problema, essa era uma oportunidade de aprender com outros treinadores, fazer o que gosta, dedicar-se a um time e ainda investir em seu futuro, pois ela sabia que valeria a pena.
Claro que em algum momento o dinheiro se tornou um problema, por mais que esse fosse um investimento pessoal, as contas para pagar chegavam e os filhos esperavam em casa sua volta das viagens a trabalho. Apesar disso, não deixou de fazer o que amava e dormia no carro se não tivesse condições de pagar por um hotel.
Todos eram capazes de ver o esforço que ela estava colocando nisso, então os homens do time sempre faziam questão de cuidar dela como podiam. Como se as coisas já não estivessem ruins o suficiente, ela perdeu o emprego. Porém, na vida uma porta se fecha para que outras se abram. Foi dessa forma que ela recebeu uma oportunidade de ir para Dartmouth College – que não iria aceitar por questões financeiras – mas um ex jogador enviou 100 dólares a ela e percebeu que não era hora de desistir.
Anos se passaram com ela lutando por seu currículo, eis que conseguiu um estágio no Baltimore Ravens. Deve-se entender que esse foi o momento crucial na sua vida: comprometer-se completamente com futebol ou voltar ao mercado de trabalho, uma das duas opções precisava pagar as suas contas.
Com os filhos maiores, ela escolheu o futebol. Foram 13 anos como treinadora até chegar em uma liga profissional, a AFF (Alliance of American Football), exatamente no setor de linha defensiva no time de Birmingham Iron. Foi a partir dessa oportunidade que ela foi contratada pelo Buccaneers em 2019.
“Representação importa. Se elas podem ver isso, elas podem ser isso. Nós continuaremos abrindo as portas e isso nos dá algo para lutar. Continue trabalhando, continue dando passos e mantenha-se humilde para ter certeza de que está nisso pelas razões certas. Entenda que levará um tempo e está tudo bem. O dinheiro vem depois. Envolva-se com a Women’s Football Alliance e outras organizações que te dão recursos para começar”. Lori Locust.
Mas e se ela fosse um homem? Bom, ela teria jogado futebol americano, tornar-se-ia assistente em algum programa de universidades e então subiria. Para as mulheres? Acumular experiências em qualquer lugar que puder, até terem a chance de aparecerem em um programa universitário e, com muita dedicação, serem notadas por alguma comissão técnica da NFL.
O caminho pode ser mais complexo, mais extenso, mais desafiador, mas é possível. Sarah Thomas, Maral Javadifar e Lori Locust provam isso todos os dias. Podem ter certeza de que encontrarão outros exemplos de representatividade por aqui. A elas e a tantas outras, meu muito obrigada por me ajudarem a viver em um mundo um pouco mais justo. Seguiremos trabalhando, sempre.
“As mulheres precisam se encher de coragem para alcançar seus sonhos adormecidos”. Alice Walker.
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